Leia artigo "Dia da mulher - o que comemorar?", por Geraldo Resende
Estamos “comemorando” hoje o Dia Internacional da Mulher. Colocamos assim, entre aspas, quando nos referimos a diversos aspectos do cotidiano das mulheres e, especificamente no caso de Dourados, às dificuldades que elas enfrentam quando procuram uma unidade de saúde pública, seja para cuidar de si mesmas, ou para socorrerem um filho, o marido ou um irmão ou vizinho.
Estamos assistindo, estarrecidos, a uma avalanche de procedimentos instaurados pelo Ministério Público Federal, visando investigar o que vem ocorrendo na saúde pública em Dourados, com o relato de situações absurdas que angustiam qualquer pessoa que, minimamente, tenha compromisso com a vida.
São situações que nos angustiam muito mais, em particular, porque há anos estamos batalhando incansavelmente na busca de soluções para problemas que, ao invés de terem resolutividade, agravam-se cada vez mais. Em alguns casos, os relatos que chegaram ao Ministério Público Federal beiram a um atentado contra os direitos humanos.
Na corrida contra o tempo, lá nos idos de 2007, por exemplo, vislumbrei a necessidade de uma estrutura que pudesse dar total atendimento à saúde feminina, e corri atrás dos recursos para a construção de uma Clínica da Mulher em Dourados. Os recursos foram alocados, em dezembro daquele ano, mas os procedimentos do poder público municipal, ao longo desse período, emperraram o processo de tal forma, que ainda hoje os recursos estão parados, à espera de se transformarem em ação efetiva.
Veio o ano de 2010. Em agosto daquele ano, iniciei as articulações junto ao Ministério da Saúde para conseguir, para Dourados, um novo hospital, totalmente voltado ao atendimento às mulheres e às crianças. Em dezembro daquele ano, consegui o empenho de R$ 12,9 milhões para esse projeto, que será desenvolvido em parceria com a Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD). Os encaminhamentos burocráticos já ultrapassam um ano e eu estou acompanhando e cobrando, com insistência, a solução dos entraves para que a obra comece o mais rápido possível.
Enquanto isso não ocorre, assistimos a um drama diário no Hospital Universitário, onde mulheres que acabam de dar à luz, vão para macas nos situadas nos corredores, junto com os recém nascidos, por falta de leitos. Na verdade, em Dourados, estamos retrocedendo na atenção à saúde da mulher, principalmente no mais sublime momento, que é o de dar à luz a uma vida, já que elas recebem uma assistência que, muitas vezes, beira à barbárie.Paralelamente, profissionais da saúde, principalmente os colegas médicos, além de serem mau remunerados, recebem uma carga horária excessiva e trabalham numa estrutura deficiente, onde falta de tudo, desde simples insumos e equipamentos como mamógrafos, ultrassom, e outros. A conseqüência disso é que muitos deles hoje respondem a processos judiciais relacionados a mau atendimento ocasionados pela falta de condições de trabalho, ao invés da responsabilização recair, como deveria, sobre os gestores do Sistema Único de Saúde (SUS).
Na rede básica da saúde pública de Dourados, a mulher não encontra melhor atendimento. Não por culpa dos trabalhadores da saúde, pois muitos desdobram-se para prestarem um acolhimento humano e digno. Mas, tirando isso, o quadro é dantesco: as mulheres não conseguem fazer um simples Teste de Schiller, que tem o custo de pouco mais de R$ 10,00, quando querem fazer a prevenção do câncer de colo uterino. Um exame obrigatório, como a mamografia, hoje é feito na rede particular, pago pela Prefeitura, porque o mamógrafo que destinei para o Hospital da Mulher, há mais de 10 anos, já está defasado, quando um novo poderia já ter sido adquirido com os recursos que viabilizei para a Clínica da Mulher.
Em Dourados, uma cirurgia para correção de incontinência urinária, mal que aflige grande parte das mulheres na velhice, demora de 3 a 4 anos. Uma histerectomia (retirada do útero), por causa de alguma patologia uterina, também demora um tempo semelhante.Certamente, como se nota, nada há para comemorar. Conquistas da última década, quando melhoramos os indicadores da saúde, se perderam. Índices como o de mortalidade materna, mortalidade infantil, além de percentuais de prevenção a doenças evitáveis como câncer de colo uterino já estão mostrando que nós precisamos pensar melhor a saúde da mulher em Dourados e em todo o país.
Apesar de tudo, estamos motivados a continuar na luta. Apesar das críticas, muitas vezes ferinas, que são na verdade tentativas de desconstruir nossa história, não nos farão esmorecer. Tenho uma história construída com trabalho, com projetos viáveis e exeqüíveis. Como disse o Padre Antonio Vieira: “palavras se perdem, obras ficam”.
Nessa luta, precisamos de parceiros e nada mais oportuno, agora que temos a Igreja Católica propondo debates, em todo o país, sobre a saúde. Vamos buscar essa parceria também nas instituições que compõem o Conselho Municipal de Defesa dos Direitos da Mulher e outras entidades classistas, pois precisamos discutir e encontrar soluções, a fim de que no próximo 8 de março tenhamos muitas conquistas a comemorar.
Geraldo Resende é médico e deputado federal (PMDB-MS)