O PANTANAL PERDE SEU PORTA-VOZ: MORRE MANUEL DE BARROS
20/11/2014 12h12
No último dia 13, o destino levou de Mato Grosso do Sul e do Brasil um de seus filhos mais ilustres. Filho adotivo de meu estado, Manoel de Barros foi para o céu contar para Deus, da forma mais poética, os detalhes de uma de suas criações mais belas: o Pantanal. Manoel de Barros, em seus 97 anos de vida, encheu nossos corações com toda a sensibilidade, colorido e asas possíveis de serem construídos por meio da palavra.
Manoel Wenceslau Leite de Barros pertenceu a geração de 1945, mas é mais próximo do pós-modernismo brasileiro, vanguardista, com influências europeias. Nosso recluso pantaneiro recebeu os principais prêmios da literatura brasileira, dentre eles dois prêmios Jabutis. Saiu da vida para se eternizar nas palavras, um dos poetas mais aclamados da contemporaneidade. A população brasileira teve a oportunidade de redescobrir o Brasil, por meio de uma nova iconografia, por meio de um olhar inverso, através da gota da chuva, do caminho do caramujo, de um céu sem prateleiras, da liberdade do silêncio, de pedras e rãs, no meio das coisas miúdas, de uma lua prateada, das coisas.
Nosso poeta nasceu em Cuiabá em 19 de dezembro de 1916 e um ano depois, sua família foi viver em uma propriedade rural em Corumbá. Manoel de Barros mudou-se sozinho, ainda quando criança para Campo Grande, onde estudou em colégio interno e, mais tarde, para o Rio de Janeiro, a fim de completar os estudos, onde formou-se bacharel em direito, em 1941.
Através da leitura da poesia de Arthur Rimbaud, Manoel de Barros descobre que "pode misturar todos os sentidos". Quando viveu no Rio de Janeiro, aos 18 anos entrou para a Juventude Comunista. Embora a poesia tenha estado presente em sua vida desde os 13 anos de idade, escreveu o primeiro poema somente aos 19 anos. Seu primeiro livro publicado foi "Poemas concebidos sem pecado" em 1937, feito artesanalmente por amigos numa tiragem de 20 exemplares mais um, que ficou com ele. Barros rompeu com o Partido Comunista quando o seu líder, Luís Carlos Prestes, após 10 anos de prisão política durante o regime getulista, resolve declarar apoio ao presidente Getúlio Vargas, que já havia entregue sua esposa, Olga Benário, ao regime nazista da Alemanha, onde morreu.
Após sua decepção política e idealista, viveu na Bolívia, no Peru e também, durante um ano, em Nova Iorque, onde fez um curso de cinema e pintura no Museu de Arte Moderna. Na década de 1960 voltou para Campo Grande, onde passou a viver como criador de gado, sem nunca deixar de trabalhar incansavelmente em seu ofício de poeta.
Apesar de ter escrito muitos livros durante toda a sua vida e de ter ganhado vários prêmios literários desde 1960, durante muito tempo sua obra ficou desconhecida do grande público por não frequentar os meios literários e editoriais.
Seu trabalho começou a ser valorizado nacionalmente a partir de descoberto por Millôr Fernandes, já na década de 1980. Desde então, ganhou reconhecimento através de vários dos maiores prêmios literários do Brasil, como o Jabuti, em 1987, com a obra: "O guardador de águas". Foi considerado um dos maiores poetas do Brasil, sendo um dos mais aclamado nos círculos literários. Seu trabalho foi publicado em Portugal, na Espanha e na França, onde é um dos poetas contemporâneos brasileiros mais conhecidos.
O Poeta vai, mas a obra fica, ilumina, engrandece e alimenta a nossa alma. Viva Manoel de Barros, viva o Pantanal, viva o Brasil que encanta.